sábado, 28 de fevereiro de 2009

O sofrido teatro capixaba e o subproduto carioca

Traçando um olhar sobre o teatro produzido no Espírito Santo, é possível afirmar que ele caminha com as próprias pernas. A começar pelo volume de companhias e grupos surgidos nos últimos anos, num compasso bastante significativo ele vêm ganhando vida, corpo e alma.

Aqui encontramos bons monólogos, musicais, adaptações de grandes clássicos do teatro grego ( Ifigênia de Eurípides, por exemplo), da comédia brasileira (Quem casa quer casa, de Martins Pena, ficou em cartaz um bom tempo pela capital, participando também do Festival Nacional de Teatro de Vitória), teatro de rua, teatro de bonecos, e também espetáculos metalingüísticos, no caso a peça O Figurante Invisível, de Romário Bonelli, que ficou em cartaz durante longos finais de semana no final do ano passado. Alías, que espetáculo fantástico: simplesmente não existia platéia, isto é, a platéia estava no palco, junto com o elenco, ficando as poltronas completamente vazias. Fenomenal!

Temos poucos teatros, sem sombra de dúvidas. No Teatro Carlos Gomes, centro de Vitória, encontramos uma belíssima arquitetura que, no entanto, foi feita para poucas pessoas, sendo os ingressos dos grandes espetáculos disputados quase que a tapas. Na Universidade Federal do Espírito Santo temos um teatro estranho, que é utilizado muito mais para colação de grau do que para espetáculos teatrais. O Cine-teatro Glória foi comprado pelo SESC, com a promessa de virar um centro cultural (espero que não esqueçam do teatro!). O Teatro Galpão, de propriedade particular, talvez seja o que mais produz teatro em todo o estado. Embora não tenha uma boa estrutura, e não tenha ar-condicionado (em tempos de verão a platéia anseia assistir pelada os espetáculos!), sempre tem alguma peça em cartaz, e peças capixabas.

Se não bastasse a falta de um bom (grande) teatro, a cultura teatral capixaba esbarra em outro grande problema: segundo Milson Henriques, consumimos uma arte que é subproduto do Rio de Janeiro. Qualquer espetáculo “abestalhado” global, aqui, lota mais do que um bom espetáculo capixaba. Há pouco tempo Vera Fischer veio ao estado, participando de um espetáculo onde a digníssima fica uns 30 segundos nua. Precisa dizer que o teatro da Ufes quase explodiu? Qualquer ator da Malhação ( vulga fábrica de tipos costumeiros de atores) enche mais os nossos teatros do que nossa própria produção local.
E outra coisa: essas produções chegam aqui nos seguintes preços: 50 ou 60 reais. Sabe quanto em média custa a entrada nos espetáculos capixabas? 5 a 10 reais!
Ao lembrar das palavras do Milson Henriques (escritor, ator, dançarino, estilista, criador da conhecida personagem Marly, popular no teatro e nos jornais capixabas), palavras estas proferidas num encontro promovido pelo músico capixaba Junior Bocca, numa livraria da capital, percebemos a carga de verdade personificada em alguém que sente na pele todo esse emaranhado de problemas. O problema da subproduto, e consequentemente de uma subcultura, não é só do teatro: é perceptível em todas as manifestações artísticas desenvolvidas no estado.
Em épocas de aparição de novas companhias, e de gente querendo fazer e participar, o teatro produzido no Espírito Santo sofre com a falta de público justamente por não ter amparo num espaço dominado por uma visão extremamente comercial, com fins lucrativos. Daí a necessidade de recorrer sempre as leis de incentivo, ou a patrocínios, se quiser de fato que a sua arte chegue ao grande público, com entrada gratuita, e etc.
De nenhuma maneira quero parecer bairrista. Quero apenas que as produções locais, principalmente do teatro, sejam respeitadas.
E que, se a peça global tem uma visibilidade enorme na mídia, no rádio e no jornal, que os espetáculos capixabas tenham ao menos o mínimo de divulgação, para que o público possa pesar (eu, sinceramente, acredito na inteligência do povo) e escolher o que de fato quer assistir.

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